Doação de Imóvel: Guia Completo com Custos, Documentos e Passo a Passo 2025
Doação de imóvel em vida é a forma legal de transferir a propriedade de um bem para outra pessoa antes do falecimento do dono. Pense nisso como entregar as chaves da casa para seu filho ou familiar agora, sem precisar esperar o inventário depois que você partir. Muitas famílias em São Paulo e região escolhem esse caminho para evitar brigas entre herdeiros e economizar com processos futuros.
Mas atenção: doar um imóvel não é tão simples quanto assinar um papel. Existem impostos a pagar, documentos a reunir e regras específicas que precisam ser seguidas. É como fazer uma mudança de casa: você não joga tudo no caminhão e pronto, precisa planejar cada etapa.
Neste artigo, você vai entender:
- O que é doação de imóvel e como funciona na prática
- Quanto custa doar um imóvel em 2025 (ITCMD, cartórios e taxas)
- Quais documentos são necessários para a doação
- Passo a passo completo do processo
- Vantagens e desvantagens da doação em vida
- Doação com reserva de usufruto
- Cláusulas de proteção para o doador
- Como declarar a doação no imposto de renda
- Colação de bens no inventário futuro
- Revogação da doação por ingratidão
- Quando um advogado pode ajudar
O Que é Doação de Imóvel
Doação de imóvel é um contrato gratuito onde o dono (chamado de doador) transfere a propriedade de um bem para outra pessoa (chamada de donatário) ainda em vida, sem receber nada em troca. É diferente da venda, porque não há pagamento envolvido. Funciona como um presente permanente: uma vez doado, o imóvel sai do seu patrimônio e passa para o nome de quem recebeu.
No Brasil, esse tipo de transferência está previsto no Código Civil (artigos 538 a 564), que estabelece as regras para que a doação seja válida. A doação precisa ser formalizada por escritura pública quando o imóvel vale mais de 30 salários-mínimos, o que em 2025 representa cerca de R$ 42.600,00. Para valores menores, um contrato particular pode ser suficiente, mas a escritura pública é sempre mais segura.
A doação é considerada um adiantamento de herança quando feita para filhos ou outros parentes diretos que teriam direito à herança. Isso significa que o valor doado será descontado da parte que essa pessoa teria direito na herança futura. Imagine que você tem R$ 1 milhão em bens e doa R$ 200 mil para um filho: quando você falecer, esse filho receberá R$ 200 mil a menos na divisão da herança.
Quanto Custa Doar um Imóvel em 2025
Os custos para doar um imóvel variam de acordo com o valor do bem e o estado onde ele está localizado. Em São Paulo, por exemplo, o processo completo pode custar entre 5% e 7% do valor do imóvel. Para um imóvel de R$ 500 mil, você gastaria entre R$ 25 mil e R$ 35 mil.
ITCMD (Imposto de Transmissão)
O ITCMD é o imposto estadual cobrado sobre doações e heranças. Cada estado brasileiro tem suas próprias regras e valores de isenção. Em São Paulo, a alíquota atual em 2025 continua sendo de 4% sobre o valor do imóvel. Há projetos de lei em tramitação na Assembleia Legislativa propondo a progressividade do ITCMD com alíquotas de 2% a 8%, mas ainda não foram aprovados.
Valores de isenção em São Paulo (2025):
- Doações de até R$ 92.550,00 (2.500 UFESPs) são isentas de ITCMD
- Acima desse valor, o imposto incide sobre o total da doação
- A isenção é anual, por doador e donatário
Exemplo prático: se você doar um imóvel de R$ 300 mil em São Paulo, pagará 4% de ITCMD, ou seja, R$ 12 mil. Se o imóvel valer R$ 80 mil, não pagará nada de imposto.
Taxas de Cartório
Os cartórios de notas cobram pela lavratura da escritura de doação. Essas taxas, chamadas de emolumentos, são tabeladas por cada estado e variam de 0,3% a 1% do valor do imóvel. Quanto maior o valor do bem, maior a taxa do cartório.
Custos típicos de cartório:
- Escritura de doação: R$ 2.000 a R$ 5.000
- Reconhecimento de assinaturas: R$ 15 a R$ 25 cada
- Cópias autenticadas: R$ 8 a R$ 15 cada
Registro de Imóveis
Depois de lavrar a escritura, você precisa registrar a doação no Cartório de Registro de Imóveis onde o imóvel está localizado. Essa taxa também é proporcional ao valor do bem e custa em média 0,5%.
Honorários Advocatícios
Contar com um advogado especializado em direito imobiliário facilita todo o processo e evita erros. Os honorários variam de R$ 3.000 a R$ 10.000, dependendo da complexidade da doação.
Tabela de custos para um imóvel de R$ 500.000 em São Paulo:
| Item | Percentual | Valor |
|---|---|---|
| ITCMD | 4% | R$ 20.000 |
| Cartório (escritura) | 0,8% | R$ 4.000 |
| Registro de Imóveis | 0,5% | R$ 2.500 |
| Advogado | – | R$ 5.000 |
| Total | 6,3% | R$ 31.500 |
Valores aproximados para referência
Documentos Necessários Para Doar um Imóvel
Reunir toda a documentação é o primeiro passo para fazer a doação sem problemas. Pense nisso como organizar a papelada para uma viagem internacional: sem os documentos certos, você não embarca.
Documentos Pessoais do Doador
- RG ou CNH (original e cópia)
- CPF atualizado
- Certidão de casamento, divórcio ou declaração de união estável (se aplicável)
- Comprovante de residência atualizado (últimos 30 dias)
Documentos Pessoais do Donatário
- RG ou CNH (original e cópia)
- CPF atualizado
- Certidão de estado civil
- Comprovante de residência
Documentação do Imóvel
- Matrícula atualizada do imóvel (expedida há menos de 30 dias pelo Cartório de Registro de Imóveis)
- Certidão de ônus reais (comprova que o imóvel não tem dívidas, hipotecas ou penhoras)
- Carnê de IPTU do ano vigente com pagamento em dia
- Certidão negativa de débitos municipais
- Escritura anterior ou contrato de compra e venda
- IPTU quitado dos últimos 5 anos
Autorização de Terceiros (Quando Necessário)
Se o imóvel pertence a um casal ou tem mais de um proprietário, todos precisam concordar com a doação. O cônjuge deve assinar a escritura autorizando a transferência, exceto em regime de separação total de bens. É como um carro em nome de duas pessoas: os dois precisam assinar para vender ou doar.
Passo a Passo Para Fazer a Doação
O processo de doação de imóvel acontece em três etapas principais. Seguir essa ordem é fundamental para que tudo seja feito de forma legal e sem dor de cabeça.
1. Calcular e Pagar o ITCMD
Antes de qualquer coisa, você precisa declarar a doação à Secretaria da Fazenda do seu estado e pagar o ITCMD. Em São Paulo, isso é feito pelo sistema eletrônico da Sefaz-SP. Você informa o valor do imóvel, o sistema calcula o imposto e gera uma guia para pagamento.
Dica importante: o valor declarado deve ser o valor real de mercado do imóvel, não o valor venal do IPTU. Se você declarar um valor muito baixo, a Receita pode contestar e cobrar a diferença depois, com multa e juros.
2. Lavrar a Escritura Pública de Doação
Com o ITCMD pago, o próximo passo é ir a um Cartório de Notas para lavrar a escritura pública de doação. Tanto o doador quanto o donatário precisam estar presentes para assinar o documento. Se o donatário for menor de idade ou incapaz, um representante legal deve comparecer.
Na escritura, devem constar:
- Dados completos das partes (doador e donatário)
- Descrição detalhada do imóvel (endereço, matrícula, metragem)
- Valor da doação
- Tipo de doação (pura, com reserva de usufruto, com cláusulas)
- Comprovante de pagamento do ITCMD
A escritura pode ser feita em qualquer cartório de notas, mas muitas pessoas escolhem um próximo ao imóvel ou à sua residência. Em São Paulo, alguns cartórios oferecem o serviço digital pela plataforma e-Notariado, facilitando o processo.
3. Registrar a Doação no Cartório de Imóveis
A última etapa é registrar a escritura de doação no Cartório de Registro de Imóveis da região onde o imóvel está localizado. Só após esse registro o imóvel passa oficialmente para o nome do donatário.
É como quando você compra um carro: o veículo só fica no seu nome depois que você faz a transferência no Detran. Sem o registro, a doação não tem validade perante terceiros.
O cartório de imóveis atualiza a matrícula do imóvel com os dados do novo proprietário e arquiva uma cópia da escritura de doação. Esse processo leva de 5 a 30 dias úteis, dependendo da demanda do cartório.
Tipos de Doação de Imóvel
Existem diferentes formas de doar um imóvel, cada uma com características específicas. Escolher o tipo certo depende das suas necessidades e objetivos.
Doação Pura e Simples
É a forma mais comum e direta de doação. O doador transfere o imóvel sem estabelecer nenhuma condição ou restrição. Depois da doação, o donatário se torna dono pleno do bem e pode fazer o que quiser com ele: morar, alugar, vender ou reformar.
Vantagem: processo mais simples e rápido. Desvantagem: o doador perde completamente o controle sobre o imóvel.
Doação com Reserva de Usufruto
Nesse tipo de doação, o doador transfere a nua-propriedade para o donatário, mas mantém o usufruto vitalício para si. O usufruto é o direito de usar, morar e receber rendimentos do imóvel (como aluguéis) até o final da vida.
Funciona assim: você doa o apartamento para seu filho, mas continua morando nele ou alugando e recebendo o valor do aluguel. Seu filho vira dono do imóvel no papel, mas só poderá usar ou vender o bem quando você falecer.
Vantagens:
- O doador mantém segurança de moradia ou fonte de renda
- O donatário não pode vender o imóvel sem autorização do usufrutuário
- Planejamento sucessório mais tranquilo
Desvantagens:
- O donatário não pode usar o imóvel enquanto o doador viver
- O valor do ITCMD é calculado sobre a nua-propriedade (cerca de 70% do valor total do imóvel)
Doação com Encargo
O doador estabelece uma obrigação que o donatário deve cumprir para receber o imóvel. Por exemplo: doar um apartamento para o neto com a condição de que ele cuide da avó idosa. Se o donatário não cumprir o encargo, a doação pode ser anulada.
Doação com Cláusula de Reversão
O doador inclui uma cláusula que permite o retorno do imóvel ao seu patrimônio se o donatário morrer antes dele. É uma forma de proteção para que o bem não vá para a família do donatário caso este faleça primeiro.
Cláusulas de Proteção na Doação
Além dos tipos de doação, você pode incluir cláusulas especiais na escritura para proteger o imóvel e o donatário. Essas cláusulas funcionam como travas de segurança, impedindo que o bem seja mal utilizado.
Cláusula de Inalienabilidade
Impede que o donatário venda, doe ou transfira o imóvel para outra pessoa. O bem fica “travado” no nome dele, só podendo ser transmitido por herança quando ele falecer. Essa cláusula é útil quando o doador quer garantir que o imóvel permaneça na família por gerações.
Cláusula de Impenhorabilidade
Protege o imóvel contra penhoras judiciais. Mesmo que o donatário tenha dívidas e seja processado, o bem não pode ser tomado para pagar credores. É uma forma de preservar o patrimônio familiar.
Cláusula de Incomunicabilidade
Evita que o imóvel entre no regime de comunhão de bens caso o donatário se case. O bem permanece como propriedade exclusiva do donatário, não sendo dividido em caso de divórcio. Pense nisso como uma blindagem contra separações futuras.
Atenção: essas cláusulas precisam de justificativa legal para serem válidas. O doador deve ter um motivo real e justo para impor essas restrições, caso contrário o juiz pode anulá-las.
Vantagens da Doação de Imóvel em Vida
Doar um imóvel em vida traz diversos benefícios para quem planeja a sucessão patrimonial. É como arrumar a casa antes de uma festa: você garante que tudo estará em ordem quando chegar a hora.
Planejamento Sucessório Eficiente
A doação permite que você decida, ainda em vida, quem ficará com cada bem. Isso evita que após seu falecimento os herdeiros fiquem brigando na justiça pela divisão da herança. É como dividir a pizza antes de servir, em vez de deixar todos pegarem ao mesmo tempo.
Evita Conflitos Familiares
Quando você faz a doação de forma clara e transparente, reduz as chances de desentendimentos entre herdeiros. Todo mundo já sabe o que receberá, diminuindo ciúmes e disputas.
Reduz Custos de Inventário
O processo de inventário pode ser demorado (1 a 3 anos) e caro (honorários advocatícios, taxas judiciais, ITCMD sobre toda a herança). Ao doar em vida, você adianta parte dessa transmissão, podendo até economizar impostos se aproveitar faixas de isenção.
Acompanha o Uso do Bem
Você tem a oportunidade de ver como o donatário cuida e usa o imóvel. Se houver problemas, ainda dá tempo de conversar e orientar. É diferente de deixar tudo para depois que você partir.
Permite Uso de Benefícios Fiscais
Em São Paulo, você pode doar até R$ 92.550,00 sem pagar ITCMD. Fazendo doações fracionadas ao longo dos anos, é possível aproveitar essa isenção múltiplas vezes, reduzindo a carga tributária total.
Desvantagens e Cuidados Importantes
Apesar das vantagens, doar um imóvel também tem seus riscos e limitações. É importante conhecer esses pontos antes de tomar a decisão.
Perda de Controle Sobre o Bem
Uma vez doado, o imóvel sai do seu patrimônio. Se você não incluir cláusula de usufruto, perde o direito de morar, usar ou decidir sobre o bem. O donatário vira o dono e pode até vender o imóvel sem sua autorização.
Custos Imediatos
A doação exige pagamento antecipado de impostos e taxas. Dependendo do valor do imóvel, isso pode representar dezenas de milhares de reais. Se você não tem esse dinheiro disponível, a doação pode ser inviável.
Possíveis Conflitos Familiares
Se a doação não for bem planejada ou se favorecer um herdeiro em detrimento de outros, pode gerar ressentimentos e até processos judiciais futuros. Lembre-se: a lei brasileira garante que 50% do patrimônio seja dividido igualmente entre os parentes diretos que têm direito à herança (filhos, cônjuge, pais).
Limitação da Legítima
Você não pode doar mais de 50% do seu patrimônio total livremente. A outra metade é a parte que a lei reserva obrigatoriamente para os parentes diretos. Se você doar além desse limite, os herdeiros podem contestar a doação após sua morte.
Risco de Anulação
A doação pode ser anulada ou revogada em casos de:
- Ingratidão do donatário (ofensas graves, tentativa de homicídio contra o doador)
- Descumprimento de encargo
- Sonegação de herdeiros necessários
Doação de Imóvel Entre Pais e Filhos
A doação de pais para filhos é a mais comum no Brasil. Muitas famílias em São Paulo e região metropolitana usam esse recurso para antecipar a herança e proteger o patrimônio.
Regras Específicas
Quando você doa um imóvel para seu filho, essa doação é considerada adiantamento da herança. Isso significa que o valor doado será descontado da parte que esse filho teria direito quando você falecer.
Exemplo prático: João tem dois filhos e um patrimônio de R$ 1 milhão. Ele doa R$ 200 mil em imóvel para o filho mais velho. Quando João falecer, a herança de R$ 1 milhão será dividida assim:
- 50% (R$ 500 mil) é a parte disponível: pode ser dividida como João desejar
- 50% (R$ 500 mil) é a parte reservada por lei: deve ser dividida igualmente entre os dois filhos (R$ 250 mil cada)
Como o filho mais velho já recebeu R$ 200 mil em doação, ele receberá apenas mais R$ 50 mil na herança para completar seus R$ 250 mil. O filho mais novo receberá os R$ 250 mil completos.
Posso Doar Para Apenas Um Filho?
Sim, é possível, desde que a doação não ultrapasse a parte disponível do seu patrimônio (50%). Se você doar apenas para um filho e a doação exceder a parte reservada por lei dos outros, eles poderão contestar judicialmente após seu falecimento.
Filhos Menores de Idade
Doações para filhos menores de 16 anos não precisam de aceitação formal, pois é considerada benéfica para a criança. Para filhos entre 16 e 18 anos, os pais representam o menor na aceitação da doação.
Doação e Imposto de Renda
A doação de imóvel tem impactos na declaração de imposto de renda tanto do doador quanto do donatário. Entender essas regras evita problemas com a Receita Federal.
Obrigações do Doador
O doador deve declarar a doação na ficha “Doações Efetuadas” do seu imposto de renda. Nessa ficha, você informa:
- Nome e CPF do donatário
- Valor da doação
- Comprovante de pagamento do ITCMD
Na ficha “Bens e Direitos”, o imóvel doado deve ser baixado, indicando que saiu do seu patrimônio.
Importante: não há incidência de imposto de renda sobre a doação. Você paga apenas o ITCMD estadual.
Obrigações do Donatário
O donatário deve incluir o imóvel recebido na ficha “Bens e Direitos” da sua declaração. O valor a ser declarado é o mesmo informado na escritura de doação.
Além disso, o donatário deve declarar a doação recebida na ficha “Rendimentos Isentos e Não Tributáveis”, código 14 (doações e heranças). Isso informa à Receita que o bem foi recebido sem pagamento.
Colação de Bens no Inventário Futuro
A colação é um tema que poucos conhecem, mas que tem enorme impacto no inventário. Funciona como um “ajuste de contas” entre os herdeiros, garantindo que todos recebam partes iguais da herança reservada por lei.
O Que é Colação
Colação é a devolução simbólica ao patrimônio da herança dos bens que foram doados em vida aos parentes que têm direito à herança. Não é uma devolução física do bem, mas um cálculo matemático para garantir igualdade na divisão.
Imagine que você tem três filhos e doou um apartamento para apenas um deles. Quando você falecer, esse apartamento será “trazido de volta” nos cálculos do inventário para que todos os filhos recebam partes iguais da herança reservada por lei. O filho que recebeu o apartamento não precisa devolvê-lo, mas receberá menos bens no inventário para compensar.
A colação está prevista no Código Civil (artigos 2.002 a 2.012) e no Código de Processo Civil (artigo 639). É uma obrigação legal, não uma escolha.
Como Funciona o Cálculo
No inventário, o valor de todos os bens doados em vida aos parentes com direito à herança é somado ao patrimônio deixado. Esse total forma a base de cálculo, que será dividido entre os herdeiros.
Passo a passo do cálculo:
- Some todos os bens deixados pelo falecido
- Adicione o valor dos imóveis e bens doados em vida aos herdeiros
- Calcule 50% desse total (a parte reservada por lei)
- Divida essa metade igualmente entre os parentes com direito à herança
- Desconte o que cada herdeiro já recebeu em doação
Exemplo prático completo:
Maria faleceu deixando R$ 600 mil em patrimônio. Ela tinha três filhos: Ana, Bruno e Carlos. Anos antes, Maria havia doado um apartamento de R$ 300 mil para Ana.
Cálculo do inventário:
- Patrimônio deixado: R$ 600 mil
- Apartamento doado para Ana: R$ 300 mil
- Total para calcular: R$ 900 mil
- Parte reservada por lei (50%): R$ 450 mil
- Parte de cada filho: R$ 150 mil (R$ 450 mil ÷ 3)
Divisão final:
- Ana: já recebeu R$ 300 mil em doação. Como sua parte é apenas R$ 150 mil, ela deve R$ 150 mil aos irmãos (ou recebe nada no inventário)
- Bruno: receberá R$ 150 mil em bens do inventário
- Carlos: receberá R$ 150 mil em bens do inventário
O valor do bem doado é calculado pelo preço ao tempo da abertura da sucessão (quando o doador falece), não pelo valor na época da doação. Se o apartamento doado valia R$ 300 mil na doação mas vale R$ 500 mil no inventário, será considerado R$ 500 mil.
Quando Há Dispensa de Colação
Nem toda doação precisa ser colacionada. O doador pode dispensar expressamente a colação, declarando por escrito que a doação sai da parte disponível do patrimônio (os 50% que ele pode dispor livremente).
Requisitos para dispensa:
- Declaração expressa na escritura de doação ou em documento separado
- A dispensa não pode ser tácita ou presumida
- O doador deve ter patrimônio suficiente na parte disponível para cobrir a doação
- A dispensa precisa respeitar a parte reservada por lei dos demais herdeiros
Exemplo de cláusula de dispensa:
“Declaro que a presente doação é feita a título de adiantamento da parte disponível de minha herança, ficando expressamente dispensada a colação, nos termos do artigo 2.005 do Código Civil.”
Também não há colação quando:
- A doação foi feita a quem não era parente com direito à herança na época (exemplo: neto, quando os pais ainda eram vivos)
- A doação foi feita com cláusula expressa de que sai da parte disponível
- A doação foi remuneratória (em pagamento por serviços prestados)
Revogação da Doação por Ingratidão
A lei permite que uma doação seja desfeita quando o donatário comete ingratidão contra o doador. Esse é um direito importante, mas pouco conhecido, que protege quem fez a doação de bom coração.
O Que Caracteriza Ingratidão
O artigo 557 do Código Civil lista três situações clássicas de ingratidão:
- Se o donatário atentou contra a vida do doador (tentativa de homicídio)
- Se o donatário cometeu ofensa física contra o doador
- Se o donatário injuriou gravemente ou caluniou o doador
Mas atenção: o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já decidiu que esse rol é apenas exemplificativo, não limitado. Isso significa que outros comportamentos graves também podem configurar ingratidão.
Casos Reais Reconhecidos Pelo STJ
A jurisprudência brasileira ampliou o conceito de ingratidão para incluir situações de abandono, descaso e maus-tratos. Veja casos reais julgados pelo STJ:
Caso 1: Maus-tratos psicológicos
Uma senhora doou sua residência ao irmão e cunhada, mas depois passou a sofrer humilhações constantes. Ela foi impedida de circular livremente pela casa, não podia se alimentar adequadamente e recebia tratamento degradante. O STJ reconheceu a ingratidão e permitiu a revogação da doação, entendendo que descaso, indiferença e omissão de cuidados básicos configuram ingratidão grave.
Caso 2: Abandono afetivo e material
Um pai doou imóvel ao filho que prometeu cuidar dele na velhice. Anos depois, o filho abandonou o pai, não prestou assistência nas necessidades elementares e demonstrou total indiferença. A Justiça revogou a doação por reconhecer que o abandono moral e material é forma de ingratidão.
Caso 3: Ofensas morais graves
Donatário que passou a proferir injúrias constantes contra o doador, fazendo referências desonrosas em público e atingindo gravemente sua dignidade. O STJ entendeu que ofensas que atingem a honra e dignidade do doador caracterizam ingratidão, mesmo sem violência física.
Prazo Para Revogar a Doação
O doador tem 1 ano para pedir a revogação da doação por ingratidão. Esse prazo é contado a partir do momento em que o doador toma conhecimento do ato que autoriza a revogação.
Atenção: esse prazo de 1 ano não pode ser interrompido ou suspenso. Se você não entrar com a ação judicial dentro desse período, perde o direito de revogar a doação por aquele motivo específico.
Como Fazer a Revogação
A revogação não acontece automaticamente. O doador precisa tomar as seguintes providências:
Documentar as provas: reunir testemunhas, mensagens, fotos, vídeos, laudos médicos que comprovem os atos de ingratidão
Notificar o donatário: comunicar formalmente que está revogando a doação, de preferência por escrito
Entrar com ação judicial: ajuizar ação de revogação de doação por ingratidão na Justiça
Comprovar os fatos: durante o processo, apresentar todas as provas dos atos praticados pelo donatário
Obter sentença favorável: após julgamento, o juiz declarará a revogação se comprovada a ingratidão
Registrar na matrícula: com a sentença transitada em julgado, registrar a revogação no Cartório de Registro de Imóveis
Após a revogação, o imóvel volta ao patrimônio do doador, como se a doação nunca tivesse existido. O donatário perde completamente o direito sobre o bem.
Exceções Importantes
Nem toda doação pode ser revogada por ingratidão:
- Doações remuneratórias: quando a doação foi feita em pagamento por serviços prestados
- Doações com encargo já cumprido: se o donatário cumpriu integralmente a obrigação estabelecida na doação
- Após 1 ano do conhecimento do fato: quando o prazo já expirou
Doação de Imóvel em São Paulo e Região
São Paulo possui características específicas que facilitam o processo de doação. A capital paulista e cidades da região metropolitana como Guarulhos, Osasco, Santo André e São Bernardo do Campo seguem as mesmas regras estaduais.
Vantagens em São Paulo
- Sistema eletrônico eficiente: a Sefaz-SP oferece plataforma digital para declaração e pagamento do ITCMD, agilizando o processo
- Rede de cartórios ampla: grande quantidade de cartórios de notas e de imóveis facilita o acesso aos serviços
- E-Notariado: possibilidade de realizar escrituras digitalmente, sem precisar sair de casa
- Isenção de R$ 92.550: valor atualizado anualmente, permitindo planejamento de doações fracionadas
Situação Atual do ITCMD em 2025
Em novembro de 2025, São Paulo ainda mantém a alíquota única de 4% para qualquer valor de doação. No entanto, há dois projetos de lei em tramitação na Assembleia Legislativa do Estado (ALESP) propondo a progressividade do imposto:
Projeto de Lei 7/2024: propõe alíquotas progressivas de 2% a 8% em faixas de valores
Projeto de Lei 409/2025: também propõe progressividade, com alíquotas de 1% a 4%
Esses projetos ainda não foram aprovados. Caso sejam aprovados em 2025, as novas alíquotas só poderão ser aplicadas a partir de 2026, respeitando o princípio da anterioridade tributária. Muitas famílias paulistanas estão aproveitando o ano de 2025 para fazer doações com a alíquota única de 4%, antes que possíveis mudanças aumentem o imposto para patrimônios maiores.
Como um Advogado Pode Auxiliar
Um advogado especializado em direito imobiliário auxilia no planejamento e execução correta da doação, evitando riscos e problemas futuros.
Um advogado especializado pode:
Avaliar sua situação patrimonial: analisar se a doação é a melhor estratégia para o seu caso ou se existem alternativas mais adequadas
Calcular corretamente os impostos: orientar sobre valores e evitar problemas com o fisco
Verificar a documentação: garantir que todos os documentos estão completos e atualizados antes de ir ao cartório
Incluir cláusulas de proteção: redigir cláusulas de usufruto, reversão, inalienabilidade, dispensa de colação conforme suas necessidades
Orientar sobre colação: explicar como a doação será tratada no inventário futuro e estruturar dispensa de colação se adequado
Proteger contra ingratidão: incluir cláusulas de reversão e orientar sobre os direitos de revogação
Representar você em cartórios: facilitar o trâmite burocrático
Evitar conflitos familiares: orientar sobre a divisão justa do patrimônio, respeitando a parte reservada por lei dos herdeiros
Regularizar imóveis com pendências: resolver problemas de documentação ou dívidas antes da doação
Ajuizar ação de revogação: caso seja necessário revogar uma doação por ingratidão ou descumprimento de encargo
Próximos Passos Para Doação Segura
Planejar a doação de um imóvel é uma decisão importante que impacta toda a família. Não se trata apenas de transferir um bem, mas de organizar seu patrimônio, proteger quem você ama e garantir tranquilidade para o futuro.
Antes de tomar qualquer decisão, avalie seu patrimônio total, converse com seus familiares e considere todas as opções disponíveis. A doação pode ser a melhor escolha para alguns casos, mas nem sempre é a solução ideal. Um planejamento sucessório bem feito considera diversos instrumentos jurídicos: doação, testamento, holdings familiares e previdência privada.
Se você tem imóveis em São Paulo, Guarulhos, ABC Paulista ou região metropolitana e está pensando em fazer doações, buscar orientação especializada pode ajudar a encontrar o caminho mais seguro para o seu caso específico.
Este artigo possui caráter meramente informativo e não constitui aconselhamento jurídico específico. Cada caso possui particularidades que devem ser analisadas por um advogado.
NR Advogados Imobiliários | Apoio jurídico em questões imobiliárias.
FAQ - Perguntas Frequentes Sobre Doação de Imóvel
Quanto custa doar um imóvel em 2025?
O custo total varia de 5% a 7% do valor do imóvel, incluindo ITCMD (4% em SP), taxas de cartório (0,5% a 1%), registro de imóveis (0,5%) e honorários advocatícios. Para um imóvel de R$ 500 mil em São Paulo, o custo total fica em torno de R$ 31.500.
Preciso pagar imposto de renda na doação de imóvel?
Não. A doação de imóvel não incide imposto de renda, apenas o ITCMD estadual. Porém, tanto doador quanto donatário devem declarar a operação na declaração anual de IR.
Posso doar um imóvel financiado?
Não. O imóvel só pode ser doado se estiver completamente quitado e livre de ônus. Se ainda há financiamento ativo, primeiro é necessário quitar a dívida, solicitar a baixa da hipoteca no cartório de imóveis e depois fazer a doação.
O que acontece com o imóvel doado no inventário futuro?
O imóvel doado será “trazido de volta” simbolicamente ao patrimônio da herança através da colação, para garantir igualdade entre os herdeiros. O herdeiro que recebeu a doação terá esse valor descontado de sua parte na herança. A colação pode ser dispensada se o doador declarar expressamente na escritura.
Posso revogar uma doação se o filho me abandonar?
Sim. O STJ reconhece que abandono afetivo e material, maus-tratos psicológicos e descaso grave configuram ingratidão. Você tem 1 ano a partir do conhecimento do fato para entrar com ação judicial de revogação da doação. É necessário comprovar os atos de ingratidão através de provas.