Airbnb Proibido no Condomínio: Decisão Legal ou Abuso de Poder? Entenda Seus Direitos.

A popularidade de plataformas como o Airbnb transformou a forma como as pessoas viajam e se hospedam.
No entanto, essa nova realidade trouxe à tona um debate acalorado dentro dos condomínios: a locação por temporada pode ser proibida?
A proibição é uma decisão legalmente amparada ou pode configurar um abuso de poder?
O Direito de Propriedade e os Limites da Vida em Condomínio
Todo proprietário tem o direito de usar, gozar e dispor do seu imóvel. Isso está garantido pela Constituição Federal e pelo Código Civil.
Contudo, viver em condomínio impõe certas limitações. O direito de um termina onde começa o do outro.
Deveres dos Condôminos (Art. 1.336 do Código Civil):
Não usar a unidade de forma prejudicial ao:
Sossego
Salubridade
Segurança dos demais.
Dar à sua unidade a mesma destinação que tem a edificação (ex: se o prédio é residencial, o uso deve ser residencial).
A Convenção de Condomínio funciona como uma “lei interna”, estabelecendo regras para a convivência e o uso das áreas comuns e privativas.
A Convenção Condominial Pode Proibir o Aluguel por Temporada?
Esta é a pergunta central. A resposta depende muito do que está escrito na Convenção do seu condomínio.
Destinação do Edifício: A Convenção define se o prédio é residencial, comercial ou misto. A locação por temporada pode, em alguns casos, ser vista como uma atividade comercial, descaracterizando o uso exclusivamente residencial.
Previsão Expressa:
Se a Convenção proíbe expressamente a locação por temporada ou estabelece regras que a inviabilizam (como um prazo mínimo muito longo para locações), a situação é mais clara.
Se a Convenção é silente ou apenas genérica quanto ao uso residencial, a discussão se torna mais complexa.
Muitos defendem que a locação por temporada, especialmente quando frequente e com alta rotatividade, se assemelha à atividade hoteleira, o que poderia justificar uma restrição em condomínios estritamente residenciais.
O Posicionamento do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
O STJ, tribunal responsável por uniformizar a interpretação das leis federais, já se pronunciou diversas vezes sobre o tema. As decisões mais recentes têm sido cruciais para guiar o entendimento.
Tema 1.179 (REsp 2.079.900/SP e REsp 2.079.577/SP): O STJ entendeu que, se a convenção de condomínio não estabelecer um prazo mínimo para locação, o proprietário não pode ser impedido de alugar seu imóvel por curta temporada via plataformas digitais, desde que não haja desvirtuamento da finalidade residencial do imóvel ou incômodo aos demais condôminos.
Decisões Anteriores (ex: REsp 1.819.075/RS): Em outros julgados, o STJ já havia admitido a possibilidade de proibição pela convenção, especialmente se a atividade desvirtuar a finalidade residencial do condomínio ou se houver previsão expressa na convenção.
Principais Argumentos do STJ:
A autonomia da vontade dos condôminos, expressa na Convenção, é valorizada.
Há uma distinção entre a locação residencial tradicional (regida pela Lei do Inquilinato) e a locação por temporada com características de hospedagem.
A proteção ao sossego, segurança e à destinação residencial do condomínio são fatores importantes.
É fundamental notar que o STJ não estabeleceu uma regra única e inflexível para todos os casos, mas sim diretrizes para a interpretação das convenções condominiais.
Como e Quando uma Proibição Pode Ser Implementada Legalmente?
Se um condomínio deseja proibir ou restringir a locação por temporada, não basta uma simples decisão do síndico ou uma votação em assembleia com quórum simples.
Alteração da Convenção de Condomínio:
É necessário convocar uma Assembleia Geral Extraordinária (AGE) específica para este fim.
O quórum para alterar a Convenção é qualificado: 2/3 de todos os condôminos (Art. 1.351 do Código Civil). Este é um quórum difícil de ser alcançado.
Regulamento Interno:
Pode estabelecer regras de uso e convivência, como horários de silêncio ou uso de áreas comuns por hóspedes.
Não pode, contudo, proibir a locação por temporada se a Convenção não o fizer ou se a alteração da Convenção não for aprovada com o quórum correto. O regulamento não pode se sobrepor à Convenção.
“Abuso de Poder” do Condomínio: Quando a Proibição Pode Ser Questionada?
Uma proibição ou restrição pode ser considerada abusiva e, portanto, questionada judicialmente, nas seguintes situações:
Imposição da proibição sem a alteração da Convenção com o quórum legal de 2/3.
Decisão de assembleia com quórum simples tentando proibir, quando a Convenção é silente ou permissiva.
Aplicação de multas ou sanções sem previsão na Convenção ou no Regulamento Interno.
Ausência do direito à defesa para o condômino notificado ou multado.
Criação de restrições desproporcionais ou discriminatórias.
Direitos do Proprietário que Deseja Alugar por Temporada
O proprietário que deseja utilizar seu imóvel para locação por temporada também possui direitos:
Exercer seu direito de propriedade, respeitando as normas condominiais e a legislação vigente.
Participar e votar nas assembleias condominiais (se estiver adimplente).
Propor alterações na Convenção para permitir ou regulamentar a locação por temporada.
Questionar judicialmente proibições, restrições ou multas que considere ilegais ou abusivas. Para isso, é crucial reunir documentos como a Convenção, atas de assembleia e notificações recebidas.
Direitos do Condomínio e dos Demais Moradores
O condomínio e os demais moradores também têm direitos que precisam ser protegidos:
Exigir o cumprimento da Convenção e do Regulamento Interno por todos.
Zelar pela segurança, sossego e salubridade do edifício.
Aprovar e aplicar multas por descumprimento das regras, desde que previstas e com o devido processo.
Buscar a alteração da Convenção para proibir ou restringir a locação por temporada, sempre respeitando os quóruns legais.
Recomendações Práticas e Considerações Finais
A questão do Airbnb em condomínios é complexa e envolve a ponderação de diversos direitos.
Para Proprietários:
Leia a Convenção: Antes de anunciar seu imóvel, analise minuciosamente a Convenção do seu condomínio.
Diálogo: Busque o diálogo com o síndico e os demais condôminos.
Orientação Jurídica: Em caso de dúvidas sobre a legalidade de uma proibição ou se você se sentir lesado, procure uma consultoria jurídica especializada em direito condominial.
Para Condomínios (Síndicos e Conselho):
Clareza na Convenção: Garanta que a Convenção seja clara quanto à destinação das unidades e às regras de uso.
Transparência: Conduza assembleias de forma transparente, respeitando os procedimentos e quóruns.
Mediação: Priorize o diálogo e a mediação de conflitos condominiais.
Não existe uma resposta única para todos os casos. Cada condomínio possui sua própria Convenção e suas particularidades. O ideal é buscar o equilíbrio entre o direito individual de propriedade e o bem-estar coletivo, sempre pautado pela legislação e pelo bom senso.
Este artigo possui caráter exclusivamente informativo e educacional, não constituindo consulta jurídica nem parecer legal sobre casos concretos.
Perguntas Frequentes (FAQs): Airbnb e Proibições em Condomínios
Um condomínio pode legalmente proibir o aluguel por temporada (tipo Airbnb) no meu apartamento?
Sim, um condomínio pode proibir o aluguel por temporada, mas essa proibição precisa estar expressamente prevista na Convenção de Condomínio e, para ser implementada ou alterada, geralmente exige a aprovação de um quórum qualificado de 2/3 de todos os condôminos em assembleia. A simples vontade da maioria em uma assembleia comum ou uma regra no regulamento interno podem não ser suficientes se a Convenção não permitir ou for silente. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem decisões que amparam a autonomia da convenção condominial nesse sentido, especialmente se a atividade descaracterizar a finalidade residencial do prédio.
Qual o papel da Convenção de Condomínio na proibição de Airbnb?
A Convenção de Condomínio é o documento mais importante para definir se o Airbnb pode ser proibido. Ela é considerada a “lei interna” do condomínio.
Se a Convenção já proíbe ou estabelece regras que inviabilizam a locação por temporada, essa regra é válida.
Se a Convenção é silente ou permite o uso residencial de forma ampla, proibir o Airbnb exige uma alteração formal da Convenção, o que demanda um quórum de 2/3 dos condôminos.
O Regulamento Interno pode detalhar regras de convivência, mas não pode contrariar ou se sobrepor à Convenção para proibir a atividade.
O que o STJ (Superior Tribunal de Justiça) diz sobre a proibição de Airbnb em condomínios?
O STJ tem se posicionado no sentido de que a Convenção de Condomínio é soberana para decidir sobre a permissão ou proibição de aluguéis por temporada.
Se a convenção proibir expressamente, essa proibição é, em regra, válida, visando proteger a destinação residencial, o sossego e a segurança dos moradores.
Se a convenção não proibir e não estabelecer um prazo mínimo para locação, o STJ (Tema 1.179) entende que o proprietário pode alugar por curta temporada, desde que não haja desvirtuamento da finalidade residencial ou incômodo aos demais. A análise é sempre caso a caso, considerando o teor da convenção específica.
Sou proprietário e meu condomínio quer proibir Airbnb. Quais são meus direitos?
Como proprietário, você tem o direito de:
Analisar a Convenção de Condomínio: Verifique se existe alguma cláusula que já proíba ou restrinja a locação por temporada.
Participar e Votar em Assembleias: Expresse sua opinião e vote (se estiver adimplente). Lembre-se que a proibição, para ser válida através de alteração da convenção, exige quórum de 2/3.
Questionar a Legalidade: Se a proibição for imposta sem seguir os trâmites legais (ex: sem o quórum correto para alterar a convenção, ou por uma simples decisão do síndico), você pode questioná-la, inclusive judicialmente.
Buscar Orientação Jurídica: Um advogado especialista em direito condominial pode analisar seu caso específico e orientar sobre as melhores ações.
Qual o quórum necessário em assembleia para o condomínio proibir o Airbnb?
Para que um condomínio proíba efetivamente o aluguel por temporada (como Airbnb), alterando a destinação ou restringindo o direito de propriedade de forma significativa, é necessário alterar a Convenção de Condomínio.
O Código Civil (Art. 1.351) exige um quórum qualificado de 2/3 (dois terços) do total de condôminos (e não apenas dos presentes na assembleia) para aprovar tal alteração. Uma simples maioria em assembleia ordinária ou extraordinária não é suficiente para impor uma proibição dessa natureza se ela não estiver já prevista ou se implicar em mudança na convenção.